UNO Novembro 2022

Digitalização, para quê?

Talvez soe familiar a história de uma bela manhã acordarmos e decidirmos que vamos ficar em forma. Vamos a uma loja (provavelmente online) e compramos os nossos pesos, alguma outra máquina, ou possivelmente uma bicicleta. Entramos no YouTube, vemos tutoriais e compramos um qualquer programa de treino para iniciar a rotina. No dia seguinte, já bem equipados, sentimo-nos atléticos e, com a nossa melhor música, começamos a executar o plano. No final do primeiro dia, estamos orgulhosos, felizes por sabermos que somos desportistas, que estamos no caminho da boa forma, e talvez (porque não?) de nos inscrevermos numa qualquer competição ou corrida local. Que boa sensação, não é? Depois o tempo passa e, ao cabo de poucos dias, apercebemo-nos de que não temos o tempo necessário para ficarmos em forma. Vamos adiando, não mudamos as nossas rotinas, as máquinas deixam de funcionar, os pesos enferrujam-se, a subscrição do programa ou software expira e voltamos a ser os mesmos que éramos quando começámos “o projeto”. A moral da história é que mudar é relativamente fácil. A parte difícil é manter a mudança.

O mesmo se passa nas organizações. Quando as empresas decidem “digitalizar-se”, decidem mudar, compram o hardware e o software ou as aplicações e traçam um plano. Montam as suas ferramentas de comunicação e gestão. E também formam o seu pessoal para se adaptar à mudança. Pode ser que, nalguns casos, estabeleçam também processos e procedimentos. Falamos de uma transformação digital incipiente. A sua semente. Mas o que acontece a seguir?

Todos sabemos que a digitalização não é o mesmo que a transformação digital. E, em ambos os casos, é essencial que pensemos em termos da gestão da mudança, e não apenas da transição para a mudança. Quando decidimos ser uma empresa digitalizada, não estamos a mudar a realidade. Estamos a mudar o cenário dessa realidade (tal como acontece com os nossos pesos e programas de fitness). A realidade é o dia a dia, a sustentabilidade ao longo do tempo e a viabilidade operacional. Todos estes aspetos estão, ou, pelo menos, deveriam estar, subordinados ao plano de negócios global, à missão e visão da empresa, à sua própria essência.

Todos sabemos que a digitalização não é o mesmo que a transformação digital. E, em ambos os casos, é essencial que pensemos em termos da gestão da mudança, e não apenas da transição para a mudança.

Para que uma mudança seja sustentável ao longo do tempo, para além do hardware e do software devemos pensar na forma como vamos sustentar a mudança ao longo do tempo para que se torne o novo padrão operacional e de gestão. Para o efeito, são necessários os seguintes elementos:

Entender: Porque é que estamos a iniciar uma mudança? O que aconteceria se não o fizéssemos? Definir o impacto da mudança em termos reais e quantificáveis ajuda a compreender o motivo pelo qual a mudança tem de ocorrer.

Destino: Onde queremos chegar? Se não soubermos para onde vamos, poderemos acabar em qualquer lado. Ter uma imagem clara da nova situação e do novo padrão ajudará a definir o progresso e o sucesso.

Estratégia: A transformação digital (e a sua primogénita, a digitalização) não pode ser uma estratégia em si mesma. Deve apoiar uma estratégia existente que responda a essa essência da empresa que mencionámos.

Plano: Uma estratégia sem um plano de execução é um sonho. Nunca será parte da realidade.

Trabalho: A fidelidade ao plano traçado é essencial para controlar o progresso.

Medir e otimizar: Os ajustes são necessários e bons, desde que estejam orientados para melhorar os resultados.

Visibilidade: Normalmente, os processos de digitalização e transformação digital envolvem toda a organização. É imperativo que toda ela esteja consciente do progresso e do impacto da mudança.

Sustentabilidade: Se a mudança não for sustentada ao longo do tempo e não se tornar o novo padrão, a mudança não ocorre de facto. Tal como os nossos pesos e os nossos planos de treino, tornar-se-á obsoleta e a situação (realidade) voltará ao que era antes de começarmos a viagem.

Contudo, é certo que os processos de mudança geram incertezas, especialmente se não tivermos um sentido de propósito. Para que é que mudamos? Sejam urgentes ou não, as mudanças são concebidas para gerar uma nova situação diferente da existente. Nesse sentido, representam uma crise: uma situação instável entre duas situações estáveis. Daí que seja essencial saber qual é essa nova situação estável desejada, a nova realidade que queremos engendrar com a mudança. É aqui que o “para quê” assume uma dimensão especial. No caso dos negócios, o “para quê” foi-se transformando da cultura do lucro até à cultura do impacto. De estarmos centrados no cliente até estarmos centrados na geração de valor (sem nunca negligenciarmos o cliente).

No mundo do marketing e da comunicação, o recente estudo da Deep Digital Journey realizado pela LLYC em colaboração com o ROI Marketing Institute revelou a existência de duas grandes lacunas nas empresas:

1. Falta de uma transformação digital orientada para o negócio e a geração de valor.
2. Falta de conhecimentos profundos sobre as expetativas dos clientes e os fatores relevantes para as suas decisões de compra.

Estas duas lacunas salientam a falta de modelos de gestão com uma visão clara da transformação pretendida (da mudança), bem como de métricas relevantes para verificar se é alcançada. Destacam também a falta de visibilidade do verdadeiro impacto económico e a presença de enviesamentos no planeamento e na avaliação.

O “para quê” da digitalização é como a motivação para estar em forma. Se o propósito não for claro, se não tivermos uma imagem clara e quantificável de como queremos ser e, sobretudo, de como nos mantermos nessa nova realidade, os processos de transformação e mudança não acontecerão e só estaremos a comprar máquinas e ferramentas que, mais cedo ou mais tarde, acabarão por ficar obsoletas.

O “para quê” da digitalização é como a motivação para estar em forma. Se o propósito não for claro, se não tivermos uma imagem clara e quantificável de como queremos ser e, sobretudo, de como nos mantermos nessa nova realidade, os processos de transformação e mudança não acontecerão

Pablo Turletti
CEO da ROI Marketing Institute.
Especialista reputado com mais de 20 anos de experiência em todo o mundo em vários sectores, Turletti presta serviços a empresas multinacionais, empresas públicas e organizações sem fins lucrativos com uma abordagem sistemática para tornar os departamentos de marketing e vendas mais eficientes e com maior impacto no cash flow do negócio. Desempenhou funções de consultor e diretor para a União Europeia e o governo italiano em todos os mercados da América Latina, foi administrador internacional em três agências de marketing nos Estados Unidos, presidente de uma agência de marketing líder em Espanha e Alemanha, e membro da direção de várias organizações.

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