UNO Março 2015

O monitoramento ou a síndrome que retarda o desenvolvimento da Inteligência Estratégica

08_2Na Espanha, a extensão das práticas formalizadas de Vigilância Tecnológica e Inteligência Competitiva, VT e IC no setor empresarial começou na década de noventa e se estendeu na primeira década do século XXI, impulsionada pelo aumento da internacionalização das empresas e pela complexidade dos desafios enfrentados pelas instituições. É por isso que a transformação da informação em inteligência tornou-se, atualmente, um dos temas centrais da inteligência estratégica, IE (a seguir, também nos referimos como IC ou inteligência competitiva).

O presente e o futuro da IE estão ligados à forma como é capaz de servir às decisões estratégicas e integrar o tomador de decisão. Em muitos casos, constata-se a falta de orientação para o cliente. Esse déficit na atenção ao cliente e seu envolvimento no processo de IC limita a geração de inteligência e o processo transforma-se em uma mera prestação de informação e documentação e, a partir daí, na marginalização na organização.

Dentro da IC coexistem dois processos complementares de trabalho: um orientado à vigilância ou monitoramento das mudanças do ambiente em linha com o conceito anglo-saxão de “enviromental scanning“, e outro dedicado ao trabalho de análise e investigação das questões a serem decididas. O primeiro enfatiza o monitoramento rotineiro de sinais que alertem sobre mudanças. Seu objetivo é antecipar e prevenir as mesmas. O segundo enfatiza a análise do contexto da questão a decidir, suas implicações e tendências de evolução. Não estamos diante de uma questão de terminologia, mas sim de uma natureza diferente no modo de trabalho. Identifica-se o problema subjacente à decisão a tomar e o tempo necessário para incorporar a inteligência para a decisão. Envolve-se o tomador de decisão no processo. Neste sentido, a norma UNE 166.006 também diferencia ambas no ponto 7.1.

A interpretação de uma IC limitada a acompanhar a evolução de novidades é aquela que tem prevalecido na Espanha nas duas últimas décadas

08A interpretação de uma IC limitada a acompanhar a evolução de novidades é aquela que tem prevalecido na Espanha nas duas últimas décadas no setor empresarial. Também na América Latina. Esta interpretação não requer a interação com os destinatários, o que é crucial para transferir o grau de valor agregado. Sem esta interação, a maior parte do esforço fica limitado ao campo documental. Ou seja, simplesmente se melhora o awareness sobre os temas que preocupam. Na Espanha, entre as causas desta tendência está a maior facilidade de implantação desta, a indubitável falta de qualificação profissional – a análise não só exige o domínio de técnicas, mas, acima de tudo, experiência e formação de base. Tampouco pode-se ignorar os interesses de alguns fornecedores de soluções tecnológicas de monitoramento que, com uma automatização do rastreamento de fonte de informação e uma forma de filtrar e organizar, dão por resolvida a aplicação da IE na organização. As autoridades não têm ajudado a corrigir esse desvio. Pelo contrário, na era do dinheiro fácil e dos generosos subsídios financiaram todo tipo de projetos de vigilância tecnológica e de “observatórios” que, limitados à interpretação comentada, aumentaram ainda mais o volume de informações recebidas pelos usuários, mas não o valor agregado a partir daí. Em suma, vemos que hoje, na Espanha, uma boa parte das  abordagens do IE não passam do modo de monitoramento e, portanto, de um grau de valor documental.

É importante uma reconsideração do papel da IE por parte da alta administração nas organizações espanholas e latino-americanas

Suas consequências privaram a IE, em muitas organizações, de um acesso direto aos tomadores de decisão. Com isto, a IE tem sido relegada a segundo plano em função do valor agregado, pois tem prevalecido as tarefas e considerações documentais e não a das análises a partir das informações. Além disso, ao limitar-se a estas interpretações, esta visão da IC passa a competir com os diferentes – e cada vez mais – potentes modos de acesso individual à informação que hoje permite a Internet.

Em conclusão, a IC forma parte das respostas desenvolvidas pelas organizações para fornecer à direção das companhias, as chaves para conduzir a estratégia e muitos dos temas táticos em um mundo como o atual, com elevado grau de incerteza e velocidade de mudança.

  • Esse grau de incerteza e velocidade de mudança tem levado a uma obsolescência de uma parte das práticas tradicionais que a coleta de informações e a análise na tomada de decisão não estruturada enfrentam.
  • Importância de identificar os fatores de condução das questões a decidir.
  • O valor e o principal desafio reside na análise e na pesquisa do assunto a decidir e não no monitoramento e coleta de informações, embora ambos sejam necessários.
  • É importante uma reconsideração do papel da IE por parte da alta administração nas organizações espanholas e latino-americanas.
Fernando Palop
Professor adjunto da Escola Técnica Superior de Engenheiros Industriais da Universidade Politécnica de Valência
Graduado em Economia e Direito, e especialista em monitoramento tecnológico e inteligência competitiva. Co-fundador, em 1998, da empresa Triz XXI SL (www.triz.es), criada com o objetivo de fornecer soluções de software, consultoria e formação em inteligência competitiva e inovação. Membro do Comitê Técnico 166 de normalização em P&D, na Associação Espanhola de Normalização e Certificação (AENOR), foi relator da norma UNE 166.006 sobre Sistema de Vigilância Tecnológica e Inteligência Competitiva. Além disso, é especialista espanhol credenciado pela AENOR no CEN 386 WG 6, sobre Strategic Intelligence Management. Fernando também é professor associado, desde 2000, à Escola Técnica Superior de Engenheiros Industriais da Universidade Politécnica de Valência, na área de Gestão.

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