UNO Outubro 2017

Cidades médias: uma visão a partir do desenvolvimento agrícola da América Latina e Caribe

A urbanização é uma tendência global irreversível. E a América Latina não é a exceção, tendo passado pelo processo de migração de uma grande porcentagem dos habitantes das áreas rurais para as cidades, em busca de melhores condições de vida.

Consequentemente, o crescimento das urbes trouxe sérios problemas, como a pressão sobre os serviços básicos, o transporte, a contaminação ambiental, os assentamentos informais, a delinquência e a insegurança. Por outro lado, o abandono de áreas agrícolas causou uma redução no número de unidades produtivas agroalimentares, na oferta de alimentos e no envelhecimento das comunidades rurais. Do mesmo modo, a pressão urbana sobre as terras agrícolas e florestais é cada vez maior. Nesse contexto, surge a necessidade de analisar soluções estruturais e integrais para enfrentar os complexos problemas decorrentes dessas mudanças.

As cidades médias, definidas como nós articuladores entre as grandes cidades e o campo produtivo, podem fazer parte da solução para esta situação, evitando a migração da população rural para as grandes cidades e, ao mesmo tempo, fortalecendo sua identidade, territorialidade e uma nova institucionalidade produtiva que ajude a equilibrar o problema.

As cidades dos países em desenvolvimento e dos desenvolvidos recebem de forma permanente milhões de pessoas que tentam integrar-se na vida urbana, gerando problemas de adaptação, saúde, insegurança e oportunidades de trabalho. Por outro lado, as grandes cidades em constante crescimento consomem 75 % dos recursos energéticos e emitem 80 % do carbono que contamina o meio ambiente. Junto com o que foi dito antes, devemos podemos esquecer a projeção de que o planeta terá mais de 9 bilhões de habitantes em 2050, dos quais, mais de 70 % vivendo nas grandes cidades.

A América Latina é a região mais urbanizada do mundo, com 80 % da população vivendo em grandes cidades, sendo 25 % dela em condições de pobreza em assentamentos informais onde predomina a desigualdade, a exclusão social e a vulnerabilidade de diversas índoles. Além disso, existe uma baixa competitividade urbana, já que somente 13 cidades da América Latina estão entre as 120 mais competitivas do mundo.

A realidade anterior está possibilitando a construção de um novo padrão de desenvolvimento que estimula uma visão territorial do desenvolvimento e a desmitificação da dicotomia urbano-rural. Diante da atração gerada pelas grandes cidades, é necessário identificar cidades médias que construam redes de serviços, tenham funções de articulação e deem resposta às necessidades objetivas da população, para que continuem produzindo alimentos de maneira eficiente e sustentável.

Sua meta deveria ser trabalhar em alianças público-privadas, e à sociedade civil caberia assumir a liderança em inovar, complementar e apoiar a execução de políticas públicas, que construam a capacidade de gestão dos recursos humanos, econômicos e naturais, e permitam a execução de planos e projetos para que a área rural possa conseguir uma maior produtividade para proporcionar segurança alimentar às cidades e à oferta de alimentos e serviços.

A academia, as agências de cooperação e a iniciativa privada têm um papel fundamental neste processo. Elas têm a função de promotores das inovações tecnológicas porque podem identificar as tendências globais e estudar patrões de comportamento: soluções inteligentes, que acompanhem as políticas públicas nacionais e locais.

Por sua vez, a conectividade e as redes sociais na América Latina têm a função de socialização da informação no processo de desenvolvimento, integração e exercício de cidadania. É uma variável imprescindível porque permite o acesso ao conhecimento e o protagonismo a atores locais e a outros distantes geograficamente.

A conectividade e as redes sociais na América Latina têm a função de socialização da informação no processo de desenvolvimento, integração e exercício de cidadania

A preocupação com a disponibilidade e a qualidade dos alimentos nas cidades exige pensar sobre a relação com as áreas produtivas e sua relação com os mercados urbanos potenciais, que identifiquem sistemas agroalimentares inteligentes e justos, sustentáveis e com identidade. O setor turístico está muito vinculado à produção agropecuária, porque possui uma forte presença e incidência nas áreas rurais, convertendo-se em um fator de coesão social e dinamizador real da economia.

As cidades médias na América Latina e Caribe são espaços até agora definidos apenas pelo tamanho de sua população, e não têm um desenho planejado para que possam constituir-se em centros que, por ter maior coesão social devido ao seu número de habitantes, podem alcançar a qualidade de “nós”, oferecendo os serviços e as facilidades de uma cidade grande, e interferindo com sua dinâmica, no desenvolvimento de outras populações menores e da área rural à sua volta.

As cidades médias na América Latina e Caribe são espaços até agora definidos apenas pelo tamanho de sua população, e não têm um desenho planejado para que possam constituir-se em centros

Atualmente, a definição desta categoria depende de cada realidade nacional em sua relação de população, oportunidades e serviços, e nem sempre têm a atenção prioritária dos organismos internacionais nem dos Estados, porque não competem com os problemas das grandes urbes em superpopulação, mobilidade, segurança e exclusão.

Esta qualidade aparentemente positiva das cidades médias, não se reflete do mesmo modo nas respostas oferecidas pelas instituições estatais, para que não se repitam nelas os problemas do padrão de desenvolvimento urbano.

Além disso, devemos destacar que, diante da aplicação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, as cidades médias vêm adquirindo um papel protagonista nos debates e acordos das organizações internacionais.

Finalmente, é fundamental considerar que as decisões dos criadores de políticas para as cidades médias, influem significativamente em: (i) A efetividade da gestão do desenvolvimento da agricultura, já que condiciona o maior ou menor acesso a serviços, tecnologias e infraestrutura. (ii) As condições de acesso e expansão das oportunidades de mercado para uma maior variedade de produtos, e a (iii) promoção de uma melhor qualidade de vida dos habitantes.

Víctor M. Villalobos
É diretor geral do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).
Possui mais de 35 anos de experiência nas áreas de agricultura e recursos naturais e genéticos. Foi professor, pesquisador, diretor de pesquisa, funcionário internacional, funcionário público, administrador, negociador e líder de grupos multidisciplinares de análise e decisão. Como pesquisador, promoveu o desenvolvimento da biotecnologia agrícola no México e no mundo. No México, foi subsecretário de Recursos Naturais e subsecretário de Agricultura da Secretaria de Agricultura, Pecuária, Desenvolvimento Rural, Pesca e Alimentação (SAGARPA). [México]

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